quarta-feira, maio 26, 2010

21 Dias, monno

"Prefiro você a ficar em paz". " Se seu excesso, se toda a sua urgência, nunca é demais." É na fantasia que o homem cotidiano, tributável, que o Pessoa com outro nome repugnou, sobrevive. Por isso nas obrigações, faltas, sabemos que precisamos dessa dose de exagero, por isso cremos na arte, pois por mais simples que seja, ela representa nossa fantasia embelezada, pulsando na nossa frente, em nossos sentidos. E quando tudo isso acaba, resta a paz. A maldita paz que já falei aqui citando a Mrs. Dalloway. Quando eu escutei essa música ao vivo no último sábado, eu esqueci de minhas análises técnicas, ao ouvir a palavra mágica: excesso. O excesso está aqui dentro e ele explode tão escondido e comedido que se evidencia num vexame. Pois eu não coloco carisma nele, eu não faço declaração de minha empolgação com as pessoas. Ainda estou demorando escrever aquela grande carta aos meus amigos. Ainda não falei que gosto dos excessos e dores que algumas pessoas me impelem. E me vem uma personagem que também não consegue ter esse excesso comigo e nos vejo explodindo por dentro. Mesmo que a explosão só esteja em mim. E isso não é só uma frase feita na música. "Ao partir, esqueça algum sinal de que irá voltar." Porque não queremos ficar a sós com a paz. A gente quer ficar desequilibrado, para depois ter ressaca. Eu não acredito em rotina, apenas em ressaca. E me recupero por uns dias, certo de que o caos irá voltar.

aqui...
http://www.youtube.com/watch?v=xezNwE5Az7Y

sexta-feira, maio 07, 2010

O espectro ululante

Nos ventos frios que faziam enquanto eu dormia, pude ter tato naquela imagem embaçada do sonho. Era uma cidade grande, havia deixado o carro que não consegui dirigir abandonado numa esquina vazia de uma avenida de 10 pistas. Subi, procurando onde eu deveria ir. Descobri sua casa, era um apartamento, mas tinha uma espécie de passagem secreta para onde eu estava. Conversamos e sua mãe, com uma voz estrangeira, perguntou se aquele era eu, vocês conversaram como se eu não estivesse ali, ela afirmou que não seria interessante estar comigo, porque você não gostava de mim e eu poderia lhe causar mal, talvez as deixassem confusas, sugeriu que me convidasse a entrar pela porta principal, para discutir umas questões, que a estavam incomodando nas noites mal-dormidas e nas leituras de alguns filósofos. Ela saiu. Você repetiu o que ela disse, chegou perto de mim com seus lábios de negra e seu rosto branco. Suspirou um ar quente, abraçou-me e não me beijou. Quase acordei. Estranhamente continuei do lado de fora, dentro daquela metrópole abandonada. Fechei os olhos, desci do elevador e sentei numa das cadeiras da sala. A sua mãe estrangeira falava sobre como se sente ao ler um texto da Llansol. Você olhava para baixo como se lamentasse. Ela balbuciou murmúrios. Estranhamente desapareceu. Você olhou para mim e disse que ainda estava apaixonada, mas precisava que eu aparecesse de vez em quando. Eu não era o outro. Mas sendo eu, lhe causava certa vivência quando se escorava em algum código desconhecido que alguém lhe dizia num aparente lugar-comum. Cada sorriso amarelo seu e cada toque em sua escrivaninha parecia me tocar na garganta. Eu não me fazia frequente em sua vida. O nosso tempo corria paralelo. E a gente não vivia apenas nos nossos intervalos. Vivíamos agora no meu sonho. Seguraria a saudade. Deixaria as gotas de encontro um pouco de lado. Esperaria um outro tipo de eternidade. Talvez na memória.
 
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