terça-feira, janeiro 26, 2010

r.e.m.

Movo em ti. Garças tiram-na para aquilo que deveras sentes. Fogem do horizonte no vôo, seguem teu ônibus mágico. Preço promocional. Especulo na carne crua mais vida do que existe. Te amo como a faca do açougueiro. Oferecerás o amor de verme. Não saberei sê-lo. A ficção morre no sono, despede-se no sonho, vinga-se no desfalecer. Durmo mais do que existo. Até que tua imagem durma. Não exista. Seremos outros e não seremos nada. Era uma outra? Abandonou o que és, para sentir mais do que és, além. Sou um personagem inócuo. Não me enxergarás. Escuta-me, talvez, se colocar teus ouvidos próximos. Se tu tiveres dormido, imagem, perdoa-me se serão só sussurros.

quarta-feira, janeiro 20, 2010

nome-do-pai

Eu sei onde está minha falta e sei quando não falto a alguém. Por isso, acabo sendo faltoso às vezes, e deixo você buscar o que não tem e até, de vez em quando, eu.

quarta-feira, janeiro 13, 2010

Os fios

Permanecia protegida numa redoma. Andando em frente por um único pensamento. A obsessão de sentir aquilo cada vez mais fundo. Sentir-se uma só, perdendo os múltiplos nuances que habitavam em seu ser, que a deixavam às vezes perdida. O desejo dela por ele tornou-se uma religião. Olhar para dentro de si era seletivo, enxergando apenas o que reverberava daquele sentimento. Não conseguiu mais estar plena com outras coisas que a intrigavam. Tornava-se cada vez mais uma pessoa mais fácil de definir. Por isso, ficou em paz, com um espírito involuído e feliz. Cresceu naquilo que era, conquistou o que programou e um dia qualquer abandonou ele porque as suas outras partes interiores reclamaram para si o direito de também sê-la. Queria visitar o seu labirinto interior. Precisava matar o minotauro. Um dia de luz, arranjou um novelo de linha infinito. Aprendeu vários caminhos de ida e volta. Percorreu-os, ficando longos períodos fora e dentro do labirinto, até o dia de sua morte.

terça-feira, janeiro 05, 2010

Colagem

Eu, moreno preto quase branco, sou de São Paulo, lugar em que há brancos paulistas e pretos nordestinos e alguns quase paulistas quase pretos. Sinto Recife. Mudo para outro lugar do sudeste. Minas? Grudo no suor de uma batida maracatu. O Chico Science me faz sentir brasileiro. Comunico-me com você, após o fino. Eu sinto. Nossa, cara, eu sinto! Minha leveza faz você sentir-se muito melhor do que papos sobre nouvelle vague e Bergman. Aproprio muito melhor desse sangue quente que faz rir, do que o sangue gelado, que tenta fazer você querer se esquentar. Comigo não é só desejo não. Não preciso  mostrar o que tem dentro de mim. Te envolvo. E o engraçado é que no fundo garotas assim preferem o gelado, mas como cult brasileiro, simplifico as coisas. Sente a batida, não preciso de peso para ser intenso. Não suportaria a seriedade de um europeu. Na nossa festa, adorou esquecer aquele cara que cantava Radiohead para dançar comigo, peito forte, suor perfumado, um uh uh que beleza, ao dizer no ouvido, cravando os dentes no meu alargador, que por causa de você bate em meu peito baixinho calado coração apaixonado por você. Depois disso quase comprou o livro Universo em Desencanto, viveu as viagens da paz interior, dos seres de luz, e ignorou os amigos que insistiam que era recalque não ler mais as reflexões cortantes de um Herman Hesse. Tá bom, deixa o Tom Morello fazer funkar aquela guitarra. Deixo pedir Light my fire. O ruim é quando vem a ressaca. Você pensa, enjoa do meu corpo, pede um fino, coloca os óculos, lê cartas, busca algo aí dentro não sei o quê, some uns dias, busca o gelado, toma um café com licor, intriga o seu outro camarada e volta pra mim, porque prefere nosso caminho Marajó.
 
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