segunda-feira, agosto 11, 2008

De uma arte expandida em realeza


De uma arte expandida em realeza


"Vai saber quantos corpos jazem sob o seu poder
Quantos beijos você quis distribuir
E eu que nunca sei se você pensa mesmo em ser atriz"


Era insustentável para ele ter que ficar de fora, na vitrine da exposição da substância tão particular do outro, sem poder tocar. Sentia que ambos permaneciam presos na existência de cada um. Quis morrer um dia para ter um espetáculo à parte, seu, e que os outros vissem se quisessem, mas que fosse tão raro, que nem ele mesmo poderia ir novamente ao seu encontro. Ela desde então aumentou seu zelo – pois para ela a morte dele seria exposição para sempre, o não poder tocar deixaria de ser uma angústia para tornar-se silêncio.

De uma arte expandida em realeza

O texto nos fala dele apoiando os pés na poltrona de sua frente e de suas mãos no amenizar de vez em quando o frio do ar condicionado. Os movimentos dos braços naquela dança pareciam chamar alguma coisa, caberia ali um sopro de clarineta, o som era imediatamente antes do movimento, pensou que assim se fosse instrumentista poderia conduzi-la naquele momento também. Essa coisa de ficar de fora! Como instrumentista não deixaria aquele doce piano, pois aquilo não o fazia sentir o doce, mas na dita insustentabilidade poderia arranhar com um arco de violino um acorde distorcido na guitarra, passaria para o palco sua angústia e ela sentiria sua substância. E se ele fosse um bailarino escondido na platéia pronto para subir ao palco? Anunciaria sua hora com a silhueta de um navio, viria cortando as ondas no seu jeito grande e desajeitado, e pisando descompassado o chão, guiado pelo magnetismo dos corpos, não seria direto, dançaria enfim sobre o comprimento de onda, tocando-a tão proximamente sem encostar a pele, mas sim palpando de leve o seu ser, num afago doce de piano, com os cheiros desenrolando-se para ele sentir de lá de sua poltrona.

3 comentários:

Flavio disse...

"Pensa que não entendo?
O inútil sonho de ser.
Não parecer, mas ser.
Estar alerta em todos os momentos.
A luta: o que você é com os outros
e o que você realmente é.
Um sentimento de vertigem...
e a constante fome de finalmente ser exposta.
Ser vista por dentro, cortada...
até mesmo eliminada.

Cada tom de voz uma mentira.
Cada gesto, falso.
Cada sorriso, uma careta.
Cometer suicídio? Nem pensar.
Você não faz coisas desse gênero.
Mas pode se recusar a se mover.
E ficar em silêncio.
Então, pelo menos, não está mentindo.
Você pode se fechar,
se fechar para o mundo.
Então não tem que interpretar papéis...
fazer caras, gestos falsos.
Acredita que sim...
mas a realidade é diabólica.

Seu esconderijo não é à prova d’água.
A vida engana em todos os aspectos.
Você é forçada a reagir.
Ninguém pergunta se é real ou não...
se é sincera ou mentirosa.
Isso só é importante no teatro...
talvez nem nele.
Entendo por que não fala,
por que não se movimenta.
Sua apatia se tornou um papel fantástico.

Entendo e admiro você.
Acho que deve representar
este papel até o fim...
até que não seja mais interessante.
Então poderá esquecer...
Como sempre esquece seus papéis."
Trecho do filme Persona, de Ingmar Bergman

Anônimo disse...

Aquele doce piano era de cauda, ou realmente tão doce que lhe escorria calda?

Anônimo disse...

"Chegue perto de mim
Não precisa falar
Acenda o meu cigarro,
Não queira me agradar
Queira, queira.

Não decida, nem pense
Não negue, nem se ofereça
Não queira se guardar
Não queira se mostrar
Queira, queira.

Escute esta canção
Ou qualquer bobagem
Ouça o coração, amor

Escute esta canção
Ou qualquer bobagem
Ouça o coração, que mais?
Sei lá!"

Qualquer bobagem - mutantes

 
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