De uma arte expandida em realeza
"Vai saber quantos corpos jazem sob o seu poder
Quantos beijos você quis distribuir
E eu que nunca sei se você pensa mesmo em ser atriz"
Era insustentável para ele ter que ficar de fora, na vitrine da exposição da substância tão particular do outro, sem poder tocar. Sentia que ambos permaneciam presos na existência de cada um. Quis morrer um dia para ter um espetáculo à parte, seu, e que os outros vissem se quisessem, mas que fosse tão raro, que nem ele mesmo poderia ir novamente ao seu encontro. Ela desde então aumentou seu zelo – pois para ela a morte dele seria exposição para sempre, o não poder tocar deixaria de ser uma angústia para tornar-se silêncio.
De uma arte expandida em realeza O texto nos fala dele apoiando os pés na poltrona de sua frente e de suas mãos no amenizar de vez em quando o frio do ar condicionado. Os movimentos dos braços naquela dança pareciam chamar alguma coisa, caberia ali um sopro de clarineta, o som era imediatamente antes do movimento, pensou que assim se fosse instrumentista poderia conduzi-la naquele momento também. Essa coisa de ficar de fora! Como instrumentista não deixaria só aquele doce piano, pois aquilo não o fazia sentir o doce, mas na dita insustentabilidade poderia arranhar com um arco de violino um acorde distorcido na guitarra, passaria para o palco sua angústia e ela sentiria sua substância. E se ele fosse um bailarino escondido na platéia pronto para subir ao palco? Anunciaria sua hora com a silhueta de um navio, viria cortando as ondas no seu jeito grande e desajeitado, e pisando descompassado o chão, guiado pelo magnetismo dos corpos, não seria direto, dançaria enfim sobre o comprimento de onda, tocando-a tão proximamente sem encostar a pele, mas sim palpando de leve o seu ser, num afago doce de piano, com os cheiros desenrolando-se para ele sentir de lá de sua poltrona.